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Opinião: O “debate” no Público acerca da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento

No espaço de Opinião na Rádio Boa Nova, Luís Filipe Torgal apresenta o artigo – O “debate” no Público acerca da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento.  Luís Filipe Torgal é professor de História do Agrupamento de Escolas de Oliveira do Hospital, investigador colaborador do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da Universidade de Coimbra (CEIS20) e autor de vários livros e artigos científicos ou de intervenção cívica.

O “debate” no Público acerca da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento

A propósito da disciplina Cidadania e Desenvolvimento (CD), António Barreto (AB) assinou no jornal Público um texto desconcertante, intitulado «Escola, cidadania e democracia» (13-08-2022). Francisco Teixeira (FT) foi lesto a responder-lhe com o artigo «O Ornitorrinco» (18-08-2022), em que, direta ou indiretamente, apelidou AB de reacionário ultraconservador, absurdo, surrealista, elitista e extremista de direita na linha de Bolsonaro!

 O que FT não vislumbrou (ou preferiu omitir) é que AB sustentou a tese do disparate da criação da disciplina autónoma de CD com o argumento de que as suas matérias são já lecionadas e avaliadas com objetividade científica nas disciplinas de História, Geografia, Ciências Naturais, Biologia, Psicologia, Sociologia, etc., as quais estão incluídas nos currículos dos ensinos básico e secundário. E esse é o cerne da questão.

A disciplina de CD é redundante, artificial e dispensável. Os seus conteúdos são demasiado prolixos e sérios para serem tratados superficialmente, em tempos letivos exíguos e dispersos (no ensino básico, 50 minutos semanais, durante um semestre; no ensino secundário, 50 minutos quinzenais, durante um ano letivo), por professores que não estão cientificamente habilitados para abordar, com o esclarecimento e rigor adequados, todos os temas abrangidos pelo seu programa [interculturalidade, igualdade de género, sexualidade, educação ambiental, saúde, literacia financeira e educação para o consumo, instituições e participação democrática, media, segurança rodoviária, empreendedorismo (palavra que não poderia faltar), bem-estar animal, mundo do trabalho, segurança, defesa e paz…]. Como se isso não bastasse, no terceiro ciclo do ensino básico, esta inédita disciplina, alegadamente dotada de tão revigorante desiderato cívico, furtou tempos letivos a Geografia, bem como a História, disciplina que os tecnocratas do Ministério da Educação têm vindo, paulatinamente, a desvalorizar e a silenciar nos currículos dos ensinos básico e secundário.    

Em suma, devíamos debater a fundo as questões e não ignorá-las ou limitar as intervenções a insultos tribais, mais ou menos embuçados, escorados em argumentos simplistas e pouco objetivos e filosóficos ou – como também fez, implicitamente, FT — recorrer ao frívolo argumento de que é «especializado em organizações educativas e administração educacional». É, pois, necessário repensar, com urgência, a existência, a forma e o conteúdo desta disciplina no contexto curricular do nosso sistema educativo.”

Luís Filipe Torgal

(Uma versão abreviada deste texto foi publicada, no jornal Público, edição digital, de 24-05-2022)

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