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Oliveira do Hospital precisa de criar um ecossistema de empreendedorismo para ter um futuro inovador e mais sustentável

Alexandre Henriques, Opinião

As recentes notícias da insolvência da IRSIL trouxeram novamente alguma apreensão à região, tornando evidente a necessidade de realizarmos coletivamente uma reflexão, na minha perspetiva inevitável, sobre como podemos construir soluções que mitiguem os riscos de possíveis crises económico-sociais na nossa região. Precisamos de ideias e soluções que permitam a Oliveira do Hospital evoluir para uma economia cada vez mais inovadora e com maior valor acrescentado, valorizando os produtos e serviços de excelência que já aqui são desenvolvidos.

É importante analisar alguns dados económicos do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia sobre o concelho, que referem que em 2021 o ganho médio mensal por trabalhador por conta de outrem no concelho de Oliveira do Hospital era 977,70€, abaixo do valor médio no continente, que era, na altura, de 1 172,10€, sendo que os homens ganhavam em média 1039,60€ e as mulheres 907,00, sendo esta discrepância, infelizmente, um espelho da realidade nacional.

Em 2021 existiam em Oliveira do Hospital cerca de 1931 empresas, sendo que os maiores empregadores eram do setor da construção civil, da indústria têxtil e o setor social com alojamento, num total de 5789 pessoas empregadas. Neste total de empregados no concelho de Oliveira do Hospital, 85,5% não tinham formação superior, o que é naturalmente o representativo da atividade económica do território.

Estes dados refletem o tecido empresarial de Oliveira do Hospital, onde a indústria têxtil e as atividades ligadas ao setor da construção civil têm uma preponderância considerável. Numa situação de crise nestes setores, o impacto social e económico será significativo. Por isso, torna-se evidente a necessidade de diversificar a economia local para melhorar a sua resiliência a eventuais choques setoriais, por exemplo, através de programas que promovam o desenvolvimento de negócios baseados em inovação tecnológica.

Outro dado curioso e que deve ser encarado como uma oportunidade é que, embora o nosso concelho venha a perder população nas últimas décadas, a região tem cada vez mais habilitações ao dispor da economia, são 2.085 cidadãos com o ensino superior, quase duplicando o valor em 10 anos. Acresce a esse número significativo de pessoas com ensino superior, a existência de um estabelecimento de ensino superior, a Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Oliveira do Hospital, que traz até Oliveira do Hospital todos anos centenas de novos alunos para o qual o concelho deve saber beneficiar deste conhecimento através da sua fixação na economia local e, também,  com a existência de uma diáspora de jovens com raízes na nossa região, altamente capacitados, e que têm trilhado percursos profissionais notáveis em várias áreas no país e também pelo mundo que podem contribuir para o robustecimento da economia local a curto prazo.

Esta transformação ao nível das qualificações das pessoas, no país e também em Oliveira do Hospital, tem vindo o ocorrer gradualmente, o que naturalmente traz outros desafios para que esta  geração fique no país, uma vez que outras economias europeias (e não só – e.g. através do teletrabalho, o mercado americano tem recrutado muito talento na área das Tecnologias de Informação) oferecem condições financeiras e profissionais ímpares comparativamente com uma grande parte da economia portuguesa.

Apesar deste êxodo, felizmente num território como Oliveira do Hospital existem alguns bons exemplos, como é o caso da Quinta de Jugais e do trabalho admirável dos seus promotores, que aliaram a inovação aos produtos tradicionais da região, vincando como é viável criar uma marca fortíssima e, com isso, promover uma ideia de negócio inovadora que tem acrescentado valor económico à região – enche-me de orgulho cada vez que viajo e deparo-me na denominada “duty free” com os produtos da empresa e saber que potencialmente 34 milhões passageiros do aeroporto de Lisboa podem levar um pedaço de Oliveira do Hospital com eles.

No eixo do conhecimento, importa salientar o trabalho notável dos promotores da associação BLC3 no desenvolvimento de Research & Development num território do interior do país, com investigação de excelência valorizada internacionalmente, contribuindo incomparavelmente para a fixação de jovens qualificados na nossa região e para o ecossistema de inovação em Portugal que tanto nos deve orgulhar.

Embora já existam alguns bons exemplos na região, é pertinente continuarmos a acelerar a estratégia para atrair e fixar jovens. Apesar de ser possível impulsionar a fixação de cidadãos no território com estratégias direcionadas para trabalhadores à distância, como defendi no anterior artigo de opinião, é, também, na minha perspetiva, fulcral apostar fortemente na criação de um ecossistema de empreendedorismo local, focado na inovação e desenvolvimento de ideias de negócio que sejam complementares/impulsionadores da economia local – com a certeza que não existem prescrições unívocas.

Analisando a realidade da região, mesmo comparando com territórios limítrofes, salta à vista a capacidade empresarial das nossas gentes que impulsionam economicamente o concelho, a existência de uma associação com foco na investigação e desenvolvimento tecnológico, uma instituição de ensino superior com formação disponível até ao nível de mestrado, ensino profissional de excelência e uma escola pública de qualidade até ao ensino secundário.

Estas instituições e respetivamente os indivíduos (dirigentes, empresários, trabalhadores, investigadores e professores) que as corporizam, com o seu saber e criatividade, per si, desempenham um papel desde já relevantíssimo, proporcionando um panorama ímpar na região, mas, na minha opinião, existirá um crescimento exponencial se as instituições assumirem conjuntamente um objetivo estratégico comum: criar um ecossistema de empreendedorismo através de um projeto educativo local que desenvolva competências dos jovens e da população ativa para esse fim.

Em Oliveira do Hospital, a criação de um ecossistema robusto de empreendedorismo, capaz de diversificar a economia e fortalecer a resiliência local, depende fundamentalmente: da integração do projeto educativo local de competências que impulsionem o ecossistema, da incubação e aceleração de ideias e do fomento de uma cultura de inovação na região. Ao alinharmos parcialmente a educação com as competências que o mercado de trabalho impele e, naturalmente, com as oportunidades económicas da região, podemos preparar uma nova geração de empreendedores inovadores e capacitados e que fiquem no território. Para isso, é importante:

Em suma, a criação de um ecossistema de empreendedorismo em Oliveira do Hospital exige uma abordagem multifacetada, na qual o projeto educativo desempenha um papel central. Ao alinhar a educação com as necessidades económicas locais e promover uma cultura de inovação e empreendedorismo, podemos preparar as próximas gerações para enfrentar desafios e aproveitar oportunidades, contribuindo para uma economia diversificada e resiliente. A sinergia entre educação e empreendedorismo assegurará um futuro mais próspero e sustentável para Oliveira do Hospital.

Alexandre Henriques  é licenciado e mestre pela Universidade de Coimbra, iniciou a sua vida profissional na Administração da Universidade de Coimbra e nestes últimos anos trabalhou como especialista em transformação digital do Estado na Estrutura de Missão Portugal Digital. Neste momento é responsável de equipa de customer experience numa instituição pública.
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